terça-feira, março 27, 2012

ensimesmado


quando alguém se propõe a um autoexame e essa análise de si mesmo se prolonga, corre-se o risco de ficar ensimesmado (do Dicionário Aulete Digital: concentrado em si mesmo).


penso que o Evangelho convida sim ao autoexame, a pensar nossos próprios caminhos perante Deus e os homens, para que haja arrependimento e confissão.

mas certas pessoas (e aqui eu me incluo) são muito dadas à introspecção. e nessa prática, chega-se a ficar ensimesmado.

a gente se "ensimesma" porque julga que nossa própria vida é muito importante.
a gente se "ensimesma" porque pensa que tem que ser sempre melhor, 
uma versão mais atualizada de nós mesmos. caímos na autoanálise frenética 
pra que nada se perca, nem um detalhe da nossa existência 
e tudo possa ser aperfeiçoado.

também penso que nada disso seria errado se não nos levasse a nos ensimesmar.
porque o Evangelho tem sim uma mensagem de aperfeiçoamento,
mas definitivamente Ele não é coisa de gente ensimesmada.

a fé em Deus tem dois movimentos, ambos para fora de nós mesmos:
1) Ele me diz para amá-lO de todo o meu coração, 
          e de toda a minha alma 
          e de todo o meu pensamento; e 
2) Ele me diz para amar o meu próximo como a mim mesmo. (Mt 22.37-39).

então, por hora, penso, ainda, que me ensimesmar não é o caminho.
centrar-me nas minhas próprias necessidades tanto e sempre
pode me levar somente a encontrar mais necessidades, em um ciclo sem fim.

desconfio que a solução seja realizar o movimento contrário, 
duplamente anunciado nas Escrituras e fazer valer as palavras de Jesus 
quando disse: "Mais bem-aventurada coisa é dar do que receber" (At 20.35).

Mais bem-aventurada coisa é dar atenção do que receber.
Mais bem-aventurada coisa é dar amor do que receber.
Mais bem-aventurada coisa é dar compreensão, aceitação, ensino, 
colaboração do que receber. é mais bem-aventurado dar ouvidos, 
dar um pouco mais de si mesmo, do que receber mais e mais de si mesmo.

termino aqui dizendo: essa é uma reflexão para pessoas ensimesmadas, 
(e me permito confessar: ensimesmadas como eu).




domingo, março 25, 2012

Sobre a boa dor...

acho que eu gosto das contradições
dos impasses, dos momentos duvidosos 
          que irrompem numa descoberta
gosto de perguntas, de longos discursos
do gostinho que fica quando você percebe que cresceu
quando você percebe que da sua vidinha contraditória,
          algum sentido está emanando


eu acho q gosto da pergunta. da novidade. do "e se..."
quem não gosta, não muda.
torna-se o ratinho no círculo.
          [o mesmo do mesmo, sempre e sempre.]


mas a pergunta amedronta. a pergunta te faz sair do ninho.
e o ninho é quentinho, é abrigo, é cômodo.
mas o ninho limita, até mesmo aprisiona.
         [e ninguém foi criado pra ele]


a liberdade do voo me espera.
mas aprender a voar dói
dá trabalho e carece de energia.


mas, hoje, talvez hoje
eu esteja atrás dessa dor boa
dor que produz arrependimento
dor que traz mudança
dor que te joga na cara quem você é


dor que te faz feliz...
contraditório?
mas é bem disso que eu gosto!




[A tristeza segundo Deus não produz remorso, mas sim um arrependimento que leva à salvação.
2 Coríntios 7.10]

sábado, março 24, 2012

Ser gente


"homem e mulher os criou"
Gn 1.27


o fato é que ser gente é mais complexo do que se pensa
ser gente envolve o abstrato das coisas desconhecidas
o sensível do que te é revelado
e a ameaça do que se quer esquecer

ser gente envolve matéria, substância bela ou não
ser gente envolve sons, luzes, cores, cheiros,
                 terra, líquidos, ventos

ser gente envolve o espírito, o Espírito

a experiência humana é uma coisa louca,
que, mesmo se for estudada,
nunca corresponde ao que é vivê-la

             ser o ser

o Inventor criou o ser humano para ser humano


qualquer tentativa de ser coisa outra equivale à frustração

tentar ser "deus" ou "irracional" ou "suprasentimental" = fracasso

se hoje eu tiver a chance de escolher qq coisa
eu escolho ser o ser humano, na sua completude,
na sua amplidão de existir

eu escolho ser o ser humano afetado pela Queda,
mas que passou pela Cruz
que vivenciou o Calvário
mas que ainda é humano
que aguarda a redenção final,
mas que respira, fala, ouve e sente
e que sabe, que neste percurso,
embola os passos de vez em quando.